Muito antes de surgir a escrita o homem já usava ervas para
fins alimentares e medicinais. Na procura das ervas mais apropriada para a
alimentação ou para a cura de seus males sentiu as alegrias do sucesso e as
tristezas do fracasso. Em suas experiências com elas descobriu as qualidades de
cada uma: alimento, medicamento, veneno,
alucinógeno e outras.
Até hoje xamãs de sociedades não letradas usam determinadas
plantas para provocar alucinações ou
para curar o paciente.
Os documentos médicos mais antigos que se referem às
propriedades medicinais das plantas é um tratado médico datado de 3.700 AC, da
China, escrito por Shen Wung um imperador sábio que fazia experiências com as
plantas. Nele era dito que para cada enfermidade havia uma planta que seria um
remédio natural. Conforme a lenda, ele podia observar os efeitos de seus
preparados no organismo por ter o
abdômen transparente.
Na faixa do tempo, seguem-se os egípcios, que deixaram
papiros preciosos. Um dos mais famosos é
de 1.500 AC, tendo sido descoberto por George Ebers, conhecido egiptólogo
alemão.
Nele podemos ver que os egípcios utilizavam ervas aromáticas
na medicina, cosmética, culinária e
,sobretudo, em sua técnica, nunca superada, de embalsamento. Eram de uso
comum plantar as ainda hoje conhecidas e
usadas: tomilho, anis, coentro, cominho, papoula, alho, cebola e outros.
Na Mesopotâmia os sumérios, considerados os primeiros agricultores
da humanidade, possuíam receitas tão preciosas, que somente os sábios
sacerdotes e feiticeiros as conheciam. Guardavam-nas na memória e somente as
transmitiam a seus substitutos na velhice. Nos escritos sumérios há referências à erva-doce, beldroega
e alcaçuz.
Relatos de historiadores da Antigüidade, ao descreverem os
Jardins Suspensos da Babilônia, construídos por Nabucodonosor , fazem
referência ao fato de que, entre flores e árvores, eram plantados o alecrim e o açafrão.
Na Bíblia há diversas referências às ervas, orientando nos
primeiros livros do Antigo Testamento para que sejam usadas somente como
alimentos, proibição atenuada nos últimos,
quando podiam ser utilizadas também com fins medicinais.
Na Índia, por volta do ano 1.000 AC encontramos o apogeu das
ervas medicinais e mágicas, se bem que as primeiras referências a elas se
encontram nos Vedas, principalmente em sua parte Athatva Veda, escrita por
volta de 2.500 AC.
O principal objetivo da medicina Hindu era prolongar a vida
e a principal fonte de conhecimento para tal eram as ervas, filhas diletas dos
deuses. Elas só poderiam ser colhidas por pessoas puras e piedosas, devendo
crescer longe da vista humana e do pecado. Eram usadas basicamente de duas
formas: como elemento para limpar o corpo, estimulando suas secreções e como sedativo.
A importância das ervas pode ser medida pelo empenho da
Europa em "achar um caminho para as Índias", com a finalidade quase
que exclusiva de adquirir as chamadas "especiarias", temperos só lá
obtidos e com alto preço nos países europeus. A babosa, o cravo, a canela,
a carambola, o gergelim, e outras, são
vegetais originários da Índia.
O grande historiador grego Xenofontes descreveu os jardins
dos reis persas daria e Giro, com flores, ervas aromáticas e fontes. Alexandre,
O Grande, quando conquistou esse reino, levou para a Grécia o mesmo modelo de jardim.
Hipócrates, o Pai da Medicina, nascido na Grécia por volta
de 460 AO. Possuía princípios éticos que
até hoje servem de juramento para os novos médicos.
Ele considerava, como na homeopatia moderna, que se deveria
tratar a doença, não o doente.A dieta, os hábitos higiênicos do corpo e da
mente eram sempre baseados em ervas e em princípios filosóficos. Seus
conhecimentos e ensinamentos atravessaram os tempos e são seguidos até hoje
em alguns tratamentos medicinais.
Foi em sua época
que surgiu a Doutrina das Assinaturas, já pesquisada pelos chineses. Ela
pregava que havia uma ligação entre a forma e a cor das flores com a doença a
ser tratada. Assim, as flores amarelas da calêndula e do dente-de-leão seriam
usadas para curar a hepatite; os frutos e as flores vermelhos, para os males da
circulação, e as raízes retorcidas e cheias de nós das figueiras seria remédio ideal para as varizes. Essas
idéias apareceram várias vezes na história da medicina e acabaram sendo fator decisivo para o descrédito
da fitoterapia.
Um dos maiores
jardins gregos foi o de Teofrasto, considerado "Pai da Botânica",
discípulo de Aristóteles e Platão, escreveu uma história das plantas onde
descreve 450 tipos de árvores, flores e
ervas em geral.
Com o apogeu do
Império Romano, o saber deslocou-se para Roma e é lá que se vai encontrar os dois maiores herbolários da Era Cristã:
Dioscórides e Galeno.
O primeiro foi
médico de Nero e com ele e seus soldados viajou por todo o mundo mediterrâneo,
colecionando centenas de tipos de plantas. Mais tarde, em 78 D.C., escreveu um
livro um catálogo de medicina herbolária, intitulada "De Maneira
Médica". Essa obra serviu de base a maior parte dos conhecimentos médicos
do Oriente, depois entrou no Ocidente pelas mãos dos sarracenos e espalhou-se
pela Europa, tornando-se a principal fonte de informação médica por centenas de
anos. A cópia mais antiga que existe da obra de Dioscórides é um manuscrito
bizantino do Séc. VI denominado " Códice Vindobonensis" , considerado
o documento médico de maior importância até o surgimento da obra de Leonardo
Fuchs, em 1542, intitulada "História Stirpium".
Galeno era grego e
viveu entre os anos 130 e 200 de nossa era. Foi médico do Imperador Marco
Aurélio, Cômodo e dois outros. Escreveu mais de duzentas obras, sendo que cerca
de cem são hoje reconhecidas como de sua autoria. Fisiologista, descobriu que a
urina é secretada pelos rins, sendo considerado Pai da Fisiologia. No entanto,
um de seus maiores feitos foi à descoberta de um método de separar os
princípios ativos de uma planta
denominado galênico, que é usado até hoje.
Com o declínio do
Império Romano e a desestruturação de sua sociedade pelas invasões bárbaras, a
importância da medicina retornou ao Oriente, que teve em Avicena (980 - 1037)
seu médico maior. Muito inteligente e estudioso, aprendia facilmente e sem
cessar medicina, filosofia, geometria, astronomia e outras disciplinas com que
se deparasse. Aos dezessete anos já era um
mestre na arte de curar, tendo já sua fama se espalhado pelo mundo
árabe. Usava lavanda, camomila e menta em seus preparos e ficou conhecido por mais de seis
séculos como o "Príncipe dos
Médicos". As primeiras farmácias, instaladas em Bagdá, datam desta
época.
Na Idade Média os
mosteiros tornaram-se centros importantes de estudo. Os livros e manuscritos
existentes foram todos recolhidos pelos monges, que se apoderaram do saber
antigo. Ao redor das igrejas, mosteiros e conventos foram cultivadas ervas,
utilizadas como alimentos, bebidas e medicamentos. Muitos destes herbários
ainda existem e são conservados até hoje na Europa, principalmente na Inglaterra.
No Séc.l X foi
criada, em Salerno, na Itália, uma universidade de medicina que reunia todos os
ensinamentos da Antigüidade. Ela logo se tornou um importantíssimo centro de
estudo e modelo para todas as outras universidades que se multiplicaram pela
Europa a partir desta época. Sua obra mais importante é o "Regimen
Sanitatis SaIernitatum", que versa sobre ervas medicinais.
Quase três séculos
após, as viagens de Marco Polo ao Oriente e seus relatos tornaram mais
importante o uso das ervas e, principalmente, das especiarias, que eram então
mercadorias de alto valor.
Com a invenção da
imprensa, em 1450, e as descobertas marítimas, inicia-se um novo ciclo,que
posteriormente iriam mudar a face do planeta.
E nesta época, nos
primeiros anos do Séc. XVI, que surge na cena médica Européia um suíço chamado
Philliphus Aurelius Theophrastros, mais tarde conhecido somente como Paracelso.
Ele viajou por toda a Europa à procura de plantas e minerais, mas
principalmente ouvindo feiticeiros, curandeiros e parteiras. Para grande
escândalo das pessoas cultas, não escrevia suas observações em latim, a língua
culta da época, mas em linguagem comum e ainda tinha a audácia de comparar
importantes estudos médicos com a sabedoria popular. Sendo hoje reconhecido
como um grande alquimista, seu maior feito foi mudar o curso da medicina
ocidental com suas descobertas e estudos,
que serviram de base para os pesquisadores dos séculos seguintes.
No reinado de Elizabeth I da Inglaterra (1558-1603) certas
ervas, especialmente as especiarias, tinham um valor e importância tão grande
quanto o ouro ou a prata e eram botim ambicionado por piratas que infestavam
todos os oceanos. Mas esta mesma Inglaterra, repleta de reis e rainhas,
príncipes e piratas, era também a Inglaterra das bruxas, fadas e duendes, seres
sobrenaturais aos quais pertencia o saber das ervas. Mesmo assim, rara era a
dona de casa que não possuía um armário
com plantas medicinais para as doenças do dia-a-dia.
Neste mesmo século o herborário mais conhecido era Gerard e
edições de seu famoso livro "The Herbal", publicado pela primeira vez
em 1597, ainda pode ser encontrado em livrarias
inglesas, sendo uma de suas ervas preferidas o alecrim.
No Séc. XVI, Culpeper tentou reviver todo o poder das ervas,
mas como acreditava demais em astrologia, bruxaria e adivinhações, ficou
desacreditado perante os médicos mais ortodoxos, que o difamaram. Ele defendia
a Doutrina das Assinaturas, a importância dos signos do zodíaco e nas cores das
pedras preciosas para curar doenças. Atualmente seus estudos são aceitos
por pesquisadores e seus livros muito
usados como fonte de consulta.
Os primeiros registros sobre as ervas americanas foram
feitos por um médico mexicano chamado Juan Badianus. Sua origem índia e seus
conhecimentos da cultura indígena tornaram seus
escritos muito procurados por estudiosos.
Outro importante herborário americano foi o espanhol
Manardes, que escreveu sobre as ervas do
Novo Mundo.
Os primeiros imigrantes trouxeram para as Américas mudas e
sementes de suas ervas preferidas, como
o confrei, a aquiléia e a camomila, que logo floresceram juntas às ervas
nativas.
Nos Estados Unidos o interesse pelas ervas teve grande
crescimento entre na época compreendida entre a Revolução Americana e a
República. Thomas Jefferson plantava pessoalmente suas ervas prediletas, entre
elas a menta, o tomilho, a lavanda, o alecrim e, sobretudo o masturtium,
conhecida entre nos por "chagas-de-cristo", por sua violenta
coloração vermelha.
No entanto, foi com os Shackers, grupo religioso que baseava
sua vida na simplicidade, que as ervas tiveram seu apogeu nos Estados Unidos e,
com eles, sua importância econômica durou mais de cem anos.
Ainda no Séc. XVIII Lineu, o grande naturalista sueco, criou
seu famoso sistema nomenclatura botânica, dividindo as plantas em vinte e
quatro classes e diversas sub-classes, o que permitiu com que os pesquisadores
fizessem um estudo mais metódico, complexo e abrangente das plantas.
No final do Séc. XIX, com o advento da Revolução Industrial,
o poder curativo das ervas passou a ser ridicularizado, a ser considerado
ultrapassado. Hoje, no entanto, no rastro do naturalismo, o mundo inteiro está
tentando redescobrir os valores curativos e alimentares das plantas.
Entre os mais famosos herborários modernos, encontramos
Maurice Messegú, francês de Gers, no sul da França. Ele aprendeu a arte de
curar pelas ervas com seu pai que, por sua vez, aprendera com seu avô. Essa
cultura repassada de geração a geração fez com que ele já fosse um especialista
no assunto aos vinte anos de idade e, hoje, com setenta anos, é considerado um
monumento vivo do herborarismo francês.
Nos Estados Unidos, atualmente, as farmácias naturais se multiplicam
e há um verdadeiro culto à natureza. Mais de 25% de todos os medicamentos são
de origem vegetal e o estudo das ervas e
seu poder de cura estão cada vez mais importantes.
Na Inglaterra o uso da medicina alternativa cresce dia a dia
e o fascínio da aromaterapia, das flores de Bach e muitas outras técnicas,
antigas ou modernas, são experimentadas com sucesso e têm cada vez mais adeptos.
Aqui no Brasil iniciou-se a trilhar este caminho, que alia o
bom senso, a ciência e o folclore.
Historicamente, quando os portugueses aqui chegaram,
encontraram índios que usavam urucum para pintar e proteger o corpo das picadas
de insetos e também para tingir seus objetos
cerâmicos.
Em verdade, estudar a ervas brasileiras é estudá-lo em sua
dimensão continental, com toda a sua
variabilidade de clima e meio-ambiente.
Infelizmente, este é um campo ainda pouco estudado e
difundido.
Os cientistas, raro felizes exceções, ainda não acordaram
totalmente para a riqueza que representa
esta flora brasileira.
Onde estará guardada a ciência do índio, tão desprezado
pelos portugueses?
O Padre José de Anchieta, em suas "Cartas", bem
que tentou despertar seus superiores para a
riqueza que era a flora e a medicina indígena, mas em vão.
Mesmo o grande naturalista Von Martius desprezava a medicina
indígena. Para ele os "selvagens" conheciam apenas algumas quantas
plantas comestíveis e outras que serviam de tinturas. Das ervas medicinais
teriam unicamente uma "obscura noção", quase sempre supersticiosa. Os
primeiros a terem utilizado a medicina das ervas, para ele, teriam sido os
bandeirantes, usando os conhecimentos adquiridos nas índias Orientais e, mais
tarde, os escravos.que se adentravam na
floresta à procura de substitutivos para a sua culinária e medicina
tradicional.
Muitos escritos sobre as ervas indígenas existem perdidas em
arquivos e bibliotecas, mas são mais consultadas como meras curiosidades, do
que como fontes de consultas para trabalhos
científicos.
Oxalá esteja o brasileiro e seus governos acordando para a
riqueza que os rodeia. Quem sabe se está chegando a um novo ciclo, onde a
atenção dada às pequenas ervas, raízes, cascas e sementes passe a ter maior
importância na alimentação e farmacopéia brasileira. Pois esta importância e
atenção num país como o Brasil, onde ainda se morre de fome e desnutrição,
torna-se um motivo estratégico, de
libertação dos medicamentos importados a alto custo, muitas vezes com
princípios ativos originários de plantas de nossas matas.
Parece que os governos não têm a visão para um fato que a
indústria farmacêutica internacional possui: a de que por trás de cada
medicamento quimicamente sintetizado há um
antepassado vegetal.